A indefinição sobre o novo regulamento de compartilhamento de postes entre as operadoras de telecomunicações e as distribuidoras de energia tem causado prejuízos – inclusive de reputação – para os dois setores, que ainda buscam consensos sobre o tema.
O cenário foi evidenciado em debate realizado na última quarta-feira, 7, durante o evento Netcom 2024, em São Paulo. Representantes das duas cadeias concordaram na necessidade de novas regras para o ordenamento das redes aéreas e de um preço regulado, mas seguiram discordando sobre pontos como a figura do posteiro.
Na ocasião, o presidente executivo da TelComp, Luiz Henrique Barbosa, defendeu que cada setor assuma suas responsabilidades pelo desordenamento atual das redes aéreas – seja pela ocupação irregular por parte das operadoras de telecom ou pela fiscalização insuficiente por parte das elétricas.
Barbosa também lamentou a decisão da Aneel de extinguir e reiniciar processo sobre novas regras, após a Anatel ter aprovado sua proposta ainda em 2023. Para o executivo, o custo da indefinição é que ambos os setores sejam vistos como “vilões” pela opinião pública e administrações locais por conta do caos nos postes.
A TelComp (que representa operadoras regionais e de infraestrutura) mapeou apenas no estado de São Paulo mais de 100 cidades com movimentos de prefeitos, vereadores, Procons ou Ministério Público cobrando ações sobre os postes. A situação seria similar em outros estados, inclusive em capitais como Porto Alegre. “Esse é o custo da inação dos setores”, afirmou Barbosa.
Já para a consultora de regulação da Associação Brasileira de Distribuidores de Energia Elétrica (Abradee), Ana Carolina Silva, a regularização da ocupação é o ponto mais desafiador do debate travado entre os setores. A entidade defendeu medidas de punição para ocupantes irregulares da infraestrutura.
Silva reconheceu que os postes não estavam preparados para a multiplicidade das empresas de banda larga, o que levou a dois grandes problemas: os acessos clandestinos e aqueles à revelia (quando uma operadora usa mais pontos do que poderia por contrato). O cenário reduz a vida útil dos postes e impacta os próprios serviços de distribuição, aponta a consultora, lembrando que o setor elétrico tem níveis de qualidade muitas vezes afetados pelo uso irregular dos postes.
Cessão e posteiro
Em paralelo, a Abradee também voltou a marcar posição contra a cessão obrigatória dos espaços nos postes a um explorador terceirizado – o chamado posteiro. Esse tem sido o principal ponto de dissenso entre os setores.
Segundo Ana Carolina Silva, não há clareza de quais empresas exerceriam o papel ou de modelos comerciais para a atividade. A consultora também manifestou preocupação das distribuidoras com questões de segurança, caso players fora do setor elétrico operem na infraestrutura.
Já a sócia e diretora da TELCOnsultoria, Katia Pedroso, defendeu o modelo da cessão obrigatória. “O explorador é a possibilidade que temos”, afirmou ela, apontando que a alternativa já fazia parte da proposta aprovada pela Anatel em 2023, sendo depois reiterada pelo governo no Decreto 12.608/2024.
“Não resta dúvida da política pública definida, e que precisa ser executada”, afirmou Pedroso. Assim, a tarefa seria estabelecer regras objetivas para o posteiro, como forma de possibilitar o surgimento de agentes interessados na atividade. A consultora ainda recordou que muitos provedores regionais defendiam uma entidade sem caráter comercial na atividade, mas aceitaram a abordagem de posteiro comercial escolhida pela Anatel e governo.
A TelComp, contudo, tem ressalvas com o modelo. Luiz Henrique Barbosa afirmou que a entidade de provedores ainda não está confortável com o arranjo proposto e destacou um leque de complexidades que devem ser enfrentadas pelo agente – vide a relação com prefeituras, departamentos de trânsito e empresas de iluminação, além das teles e distribuidoras.
Já o sócio proprietário da Simonaggio Soluções Empresariais e consultor do setor elétrico, Sidney Simonaggio, acredita que a cessão das atividades para um posteiro poderia ser um bom negócio para as distribuidoras. Vale lembrar que a própria Abradee defende a cessão como facultativa.
Já o sócio proprietário da Simonaggio Soluções Empresariais e consultor do setor elétrico, Sidney Simonaggio, acredita que a cessão das atividades para um posteiro poderia ser um bom negócio para as distribuidoras. Vale lembrar que a própria Abradee defende a cessão como facultativa.
“O compartilhamento é um fardo para distribuidora. 60% do valor vai para modicidade tarifária e os 40% [restantes] são tão pouco diante da receita e do encargo, que perto da pretensa remuneração, não vale a pena”, afirmou o especialista. Ele indicou que há distribuidoras querendo se livrar da atividade, mas que outras ainda fazem questão da receita adicional, mesmo que pequena.
“O compartilhamento é um fardo para distribuidora. 60% do valor vai para modicidade tarifária e os 40% [restantes] são tão pouco diante da receita e do encargo, que perto da pretensa remuneração, não vale a pena”, afirmou o especialista. Ele indicou que há distribuidoras querendo se livrar da atividade, mas que outras ainda fazem questão da receita adicional, mesmo que pequena.
Modicidade e preço
O “desbloqueio” dos valores pagos pelos postes e direcionados à modicidade tarifária também chegou à mesa no debate.
Katia Pedroso, da TELCOnsultoria, defendeu que os 60% poderiam ajudar a financiar a limpeza dos postes, representando benefício maior para o consumidor final do que “desconto de centavos” na conta de luz. Já a Abradee afirmou não concordar com medidas que impactem o usuário do setor elétrico.
Um ponto onde representantes dos dois setores chegaram mais perto de um consenso foi a necessidade de um preço regulado para acesso aos postes, em lugar do atual preço referência, considerado ineficaz. Mas provedores regionais também defendem que haja um teto para o valor cobrado por poste. Este tema será alvo de uma consulta pública específica.
Hoje, provedores regionais de Internet chegam a pagar valores que podem chegar a R$ 18 por poste. Muitos têm acionado a Justiça para repactuar contratos e fazer valor o preço referência, fixado em R$ 3,19 ainda em 2014, mas passível de atualização monetária.
Diálogo
Nesta quinta-feira, a Anatel publicou após quase nove meses a proposta para o novo regulamento de postes aprovada pela agência em 2023. Representantes da reguladora e da Aneel também voltaram a se reunir na busca de um consenso para o tema.
Fonte: Teletime