A Anatel notificou os provedores de banda larga (SCM e SMP) nesta quarta, 2, para que se preparem para o bloqueio de sites de apostas. Segundo declarações do ministro da Fazenda, Fernando Haddad, serão cerca de 500 sites e aplicativos que operam de maneira irregular no Brasil. A lista definitiva de IPs a serem bloqueados deve ser fornecida pela agência no dia 11, segundo a notificação a que este noticiário teve acesso.
Segundo a notificação da Anatel às operadoras de telecom, a Lei 14.790/2023 é quem dá poderes legais ao Ministério da Fazenda a competência para determinar aos provedores de conexão o bloqueio de sites e aplicativos de apostas, e aos provedores de aplicações, a exclusão dos mesmos aplicativos.
Segundo a Anatel, a cooperação com o Ministério da Fazenda se dá por intermédio da Superintendência de Fiscalização (SFI) da agência, que “auxiliará no envio das notificações cujo teor determine o bloqueio de acesso a sítios eletrônicos ou que ofertem a loteria de apostas de quota fixa em desacordo com as normas vigentes”.
A agência diz ainda que “serão utilizados procedimentos similares àqueles utilizados para encaminhar decisões judiciais versando sobre bloqueio de sítios eletrônicos, ou seja, comunicações via ofício, por intimação eletrônica SEI ou por e-mail, às prestadoras do Serviço Móvel Pessoal (SMP) e às prestadoras do Serviço de Comunicação Multimídia (SCM)”.
Ainda segundo a agência, “os primeiros desses bloqueios devem ser executados em 11 de outubro”, diz a Anatel na notificação de alerta. Informa ainda que “está trabalhando com o MF para encaminhar a decisão administrativa em prazo adequado, considerando a quantidade de sítios a serem bloqueados”.
Análise: protagonismo para a Anatel, desafio para operadoras
O papel da Anatel no bloqueio de serviços e aplicações de Internet tem sido cada vez mais relevante. Desde os primeiros episódios envolvendo bloqueio por determinação judicial do Telegram, em 2022; passando por bloqueios de TV boxes utilizadas para a pirataria de TV paga desde 2023 e hoje rotineiros; o bloqueio à rede social X (ex-Twitter) determinada pelo Supremo no mês passado; chegando agora a centenas de aplicativos e sites de apostas, duas coisas ficaram evidentes: não só a agência de telecomunicações está aprimorando o know-how e os processos para fazer as ordens serem cumpridas, como os órgão com poder de polícia (seja a Justiça, a Justiça Eleitoral, seja agora o Ministério da Fazenda no caso das apostas) estão começando a gostar de usar o recurso.
Isso dá à Anatel um protagonismo no que diz respeito ao controle dos serviços digitais que ela não tinha até muito recentemente, algo que acontece em decorrência de um imperativo prático (só a agência tem contato direto com todas as empresas), independente de uma discussão mais ampla sobre um eventual marco legal que eleja oficialmente a agência de telecomunicações como reguladora ou fiscalizadora da Internet. Ou seja, mais uma vez, a realidade está se antecipando às leis.
Esse novo papel e o protagonismo em discussões tão centrais para a vida nacional são importantes para o fortalecimento da Anatel e para dar à agência uma nova atribuição. Os papéis tradicionais da agência na regulação dos serviços de telecom têm sido naturalmente diluídos com a migração dos serviços mais relevantes para o mundo over-the-top, e a agência corria o sério risco de se tornar primordialmente uma administradora de espectro.
Mas essa rotina de bloqueios, se de um lado recoloca a Anatel no centro dos debates, de outro lado traz uma nova complexidade para os operadores de telecomunicações. Hoje, nem mesmo as grandes empresas têm equipes dedicadas a essa função de atender ordens de bloquio de IP.
A maior parte das grandes teles até tem em suas estruturas pessoas responsáveis pelo cumprimento de ordens judiciais de interceptação telefônica e telemática, por exemplo, mas são processos diferentes de bloqueios de sites e aplicativos, que demandam verificações e gerenciamento permanentes para evitar efeitos indesejados (como bloqueio a serviços legítimos).
Além disso, bloqueios de IPs precisam ser executados não apenas por grandes operadoras, mas por milhares (cerca de 20 mil) pequenos provedores, empresas de cabos submarinos, grandes roteadores e pontos de troca de tráfego, operadoras de banda larga e capacidade via satélite etc.
Em conversas reservadas, muitas empresas mostram desconforto com esses novos tempos. Dizem que é uma operação complexa, que envolve atenção, traz impacto para os consumidores (o que se reflete nos call centers), pode gerar responsabilização e são ações imprevisíveis, o que significa times sempre de plantão, independente do porte da empresa e da sua capacidade econômica. Talvez isso explique o cuidado da Anatel de deixar as operadoras de prontidão, mas isso não reduz a dimensão da tarefa. E se a moda pegar, como parece estar pegando, talvez as empresas precisem levar isso em consideração em seus departamentos de operação e times jurídico/regulatórios.
Fonte: Teletime