Para provedores de banda larga e novos entrantes no mercado, a oferta de conteúdo é um diferencial importante. Os modelos que estão sendo adotados e o papel dos atores, assim como o peso estratégico da oferta de conteúdos por assinatura para as empresas distribuidoras, foram debatidos em um painel nesta segunda-feira, dia 12 de agosto, durante o primeiro dia do PAY-TV Forum 2024, evento organizado pelas publicações TELA VIVA e TELETIME.

Alejandro Contreras, CMO da Alares, e José Carlos Rocha, diretor executivo de marketing da Vero, trouxeram as perspectivas dos ISPs. Contreras pontuou que o core da empresa é a oferta de banda larga e fibra óptica, e que quaisquer outros serviços partem dessa peça fundamental. Mas, dentro disso, o conteúdo – seja TV paga ou streaming – é um valor adicionado: “Colocamos à disposição do nosso cliente – da base ou prospect – e é uma possibilidade que temos para ofertar produtores complementares. Para nós, é super importante como complemento. Estamos procurando crescer nesse mercado, que é muito competitivo. Para isso, buscamos nos aprofundar e entender os detalhes de cada possível parceria, encontrando e definindo um jeito para que a equação financeira econômica funcione. O negócio tem que ser bom para o cliente, para o acionista e para o parceiro, encaixando todas as peças para gerar valor para todo mundo. No geral, está funcionando. E é importante continuar progredindo nesse caminho”.

Rocha, por sua vez, parte do ponto de que a indústria passa por uma transformação cíclica, que acontece mensal e quase que diariamente. “Estamos há muito tempo investindo no conceito de one stop shop. Entendemos que o core da nossa empresa é a banda larga e que ela é o caminho propulsor desse conceito – mas o cliente tem uma necessidade cada vez maior de concentrar seus pedidos, anseios e demandas em uma única plataforma. Por isso, estamos dando passos largos no sentido de ser um hub de tecnologia – com banda larga, plataformas de streaming que realmente concentrem valorização para o cliente e celular. O streaming é fundamental para gerar valor percebido. É um agregador de valor dentro da estratégia e uma forma de valorizar o produto de banda larga que existe hoje”, afirmou. “O custo de aquisição do cliente está cada vez maior. Precisamos sustentar nosso cliente na nossa base, e isso só vai acontecer se ele enxergar valor no que estamos oferecendo. E o streaming é ponto fundamental nessa percepção”, reforçou.

Estratégia bem sucedida para os programadores

Da perspectiva dos programadores, que são parceiros desses ISPs nessa missão, o jogo também é de ganha-ganha. Ranira Camelo, gerente sênior de parcerias estratégicas da Globo, contou que a empresa começou esse movimento há alguns anos e, em 2021, fechou suas primeiras parcerias, com a Vero e com a Brisanet, ambos acordos bem sucedidos. “Começamos então a desenhar a expansão dessa estratégia. Intensificamos as parcerias com os ISPs no ano passado e dobramos o volume de parceiros diretos. Também no último ano, incluímos um integrador, e hoje já temos 400 ISPs distribuindo Globoplay através desse integrador. Seguimos apostando nesse modelo e investindo nessas parcerias com ISPs. Mais do que dobramos a base nesse um ano e meio”, celebrou.

É claro que o processo de trabalhar com parceiros exigiu alguns ajustes e adaptações por parte da Globo. “O que fizemos foi, essencialmente, nos adaptar às estratégias dos parceiros. São ISPs que atuam em mercados muito específicos, com estratégias muito específicas. Não dá para montarmos uma estratégia única e simplesmente implementá-la. Precisamos entender se o parceiro está focado em rentabilização ou aquisição, por exemplo. Temos um produto que entrega valor agregado, mas ele precisa entrar na estratégia do parceiro sem elevar seu ticket ou criar barreiras de entrada. Por isso, as adaptações necessárias foram flexibilizações nos modelos de negócio com esses parceiros”, explicou.

Rogério Francis, VP de estratégia de vendas & distribuição de conteúdo da Paramount, narra uma experiência parecida. A estratégia de aumentar a capilaridade de distribuição do Paramount+, a plataforma de streaming premium do grupo, também teve início em 2021 e foi se intensificando de lá pra cá, com algumas lições e aprendizados. “Entendemos, num primeiro lugar, que estamos falando de um número absurdo de ISPs – são quase 15 mil. É um desafio. E eles não estão acostumados a trabalhar com conteúdo, mas sabem que precisam. Não estou generalizando – afinal, existem muitos – mas é o que acontece na maioria dos casos. Por isso atendê-los diretamente é um desafio – ainda mais para uma empresa multinacional como a Paramount. Colocar no portfólio 200, 400 clientes seria uma loucura”, contextualizou.

O executivo prosseguiu: “E não poderíamos deixar de pensar em como eles trabalhariam com o nosso produto – como comunicam e agem com ele. O conteúdo é rei, mas como deixo trabalharem com o meu conteúdo?”. Nesse sentido, ele detalhou que os ISPs, mesmo trabalhando em parceria com a Paramount, não fazem uso da comunicação de marca da Paramount, mas precisam estar alinhados ao que a empresa faz.

O streaming exibe, por exemplo, a Copa Libertadores, que segundo Francis, “é rigorosa com tudo”. Então a dificuldade está em alinhar os discursos e garantir que o conteúdo seja comunicado e trabalhado da melhor maneira. “Temos que olhar para isso de forma carinhosa para não sermos prejudicados. Nossos parceiros nos ajudam a chegar a outros lugares, atendem os clientes com qualidade, entregam nosso produto e são guardiões do nosso negócio. Estamos juntos desses parceiros. Mas é importante termos esse cuidado”, ressaltou. A Paramount segue atenta a oportunidades nesse mercado, que muito interessa a ela pela positiva trajetória até o momento. Assim como a Globo, a empresa tem números bastante expressivos, e destaca que os acordos com os ISPs foram impulsionadores para mais do que dobrar o número de assinantes do Paramount+.

Papel dos agregadores

Adriana Naves, head de distribuição para América Latina da Roku, representa um outro tipo de agente da cadeia, que é o agregador. A Roku se define como um “streaming simplificado”, uma vez que reúne os apps favoritos do usuário e oferece funcionalidades como a busca por voz. Hoje, ela tem quase 84 milhões de usuários no mundo, e segundo Naves, o número no Brasil é bastante relevante. Ela contou que, ainda mundialmente falando, a Roku cresceu 14% ano a ano nos lares que têm algum aparelho da marca, com um aumento de 20% no número de horas de streaming consumidas. É uma média de quatro horas por pessoa.

A estratégia segue visando o crescimento – e inclui os ISPs, como a Vero, que é parceira de longa data. “É um acordo completo, porque temos um modelo de negócio que envolve não só fazer o básico, isto é, o bundle, que sabemos fazer bem, mas também oferecemos aos ISPs a possibilidade de terem conteúdo personalizado. Temos dentro da Roku a plataforma de conteúdo da Vero, por exemplo. Apoiamos ISPs que têm esse tipo de conteúdo”, disse. A Roku trabalha com aquilo que chama de “white label content provider”, um programa que ajuda no desenvolvimento desse app para os provedores. “É a possibilidade de customização para o ISP – com o conteúdo, produto e conexão dele. Tem o app e o conteúdo, e a Roku entra como dispositivo para distribuir esse produto OTT”, detalhou. A Roku é uma agregadora de conteúdo – seja ele gratuito ou pago – e no caso dos ISPs que têm um produto, ele vai aparecer na “busca” que o serviço oferece. “A vantagem é uma plataforma agnóstica, com mais maneiras de chegar ao conteúdo”, observou a executiva. A Sky, por sua vez, passou por um relativamente recente processo de rebranding e, hoje, após entender a força da marca no Brasil, rebatizou seu streaming como Sky+, em uma mudança assertiva, de acordo com Flávia Guerra, diretora do produto OTT da Sky+. E a empresa também está atuando com a estratégia de parceria com os ISPs. “Vemos mais da metade do país hoje nos ISPs, desde os pequenos aos grandes. Nossa estratégia com eles deu ‘match’ porque temos uma marca consolidada, uma agregação de conteúdo muito forte e sabemos vender esse conteúdo. Distribuímos desde sempre”, avaliou. Guerra comentou que a Sky também trabalha por meio de integradores, que são “parceiros para chegarmos aos ISPs menores, pois não temos estrutura para estar em todos”.

Abordagens específicas e churn controlado

Todos esses agentes que foram atrás de parcerias com ISPs começaram estudando os tipos de operadores existentes no mercado. A partir daí enxergaram, como no caso da Globo, a necessidade de um integrador. “Existe um potencial muito grande. Mais de 50% do mercado de banda larga está distribuído nesses ISPs”, reforçou Camelo. Em alguns momentos, quando a empresa vê determinado ISP se destacando, desenvolve estratégias de ofertas específicas para eles – o que aconteceu com a Alares, por exemplo. “Analisamos caso a caso, num trabalho de formiguinha mesmo”, contou. Francis atua da mesma maneira: “Se um se destaca, você usa ferramentas internas e aciona o departamento interno de partner solution para estar presente e dar suporte ao crescimento desse operador”. Outro ponto de destaque nesses acordos é o churn controlado. “Para nós, o churn não tem sido uma questão. E ouvimos muito dos parceiros que o conteúdo ajuda a diminuir o churn”, destacou a executiva da Globo.

Comunicação assertiva

Francis falou ainda na necessidade de uma comunicação assertiva. O Paramount+ tem lançamentos ao longo do ano inteiro. E isso deve ser comunicado o tempo todo para que os parceiros – e seus clientes, claro – saibam. “A comunicação é o grande ponto. Estando com parceiros, é uma vantagem, porque o cliente é deles. Eles têm o CPF e os dados. A comunicação é assertiva. Se você mostra, prepara o técnico, o vendedor e a central, se está todo mundo preparado, a tendência é funcionar”.

Do outro lado da história, José Carlos Rocha, da Vero, concorda, e conta que recentemente eles fizeram questão de se “apropriar” das Olimpíadas. “Tivemos um crescimento absurdo de Globoplay + Canais porque investimos na comunicação. Envelopamos as lojas, os vendedores falaram a respeito. Temos que nos apropriar desses argumentos. Se não trabalharmos como promotores, vamos deixar o que deveria ser nosso diferencial ir embora. Somos promotores das marcas – Globo, Roku, Paramount. Tenho que me apropriar daquilo que eles têm para que o meu cliente saiba que é um diferencial. Isso faz com que ele perceba valor, o que gera fidelidade e minimiza o churn”, analisou. “Nosso core business é forte, mas só ele não adianta mais. Tenho que dar coisas novas para os clientes. Quando o cliente te percebe não como uma operadora tradicional, e sim um hub, ele se torna fiel – não só a mim, mas a tudo que está no meu portfólio. Aí o negócio para em pé. Se nesse mercado eu não pensar diferente e, acima de tudo, entregar valor agregado, serei mais do mesmo”, concluiu.

Fonte: Teletime